segunda-feira, junho 27, 2005

Quede o Rorge?!

Não sei o que anda acontecendo comigo... ando me atrapalhando com os trecos mais simples... me confundindo com os troços mais banais... me atolando em coisas triviais...

Outro dia, fiquei um tempo enorme procurando um nome numa lista com onze e não consegui encontrá-lo, não é terrível?

Vou me explicar melhor, quer dizer, pretendo...

Assistia a um jogo de futebol transmitido pela televisão – e olha que já me acostumei com muitas coisas!... ala, matador, quadrado mágico etc. etc. etc. - e na hora de recitar a escalação de uns dos times o locutor falou:
- Fulano, Sicrano, Beltrano, Rorge...
E não houve meio de eu conseguir achar no texto simultaneamente apresentado o Rorge...

Senti o primeiro tremor, mas consegui acionar o controle remoto e escolher outro canal... mas foi a mesma coisa... pois o locutor também falava no Rorge e eu procurava o nome estampado em alguma camisa, e sem sucesso...

Senti um desassossego pasmoso, um incômodo crescente... esfreguei os olhos várias vezes... questionei a quantidade de cerveja que já havia bebido...

Fui aos jornais, parte de esportes, e vasculhei uns quatro ou cinco... e nada!

A essa altura, suava frio e sentia outras reações muito desagradáveis, e eram tantas que pensava em pedir socorro...

Você sabe que, na minha (nossa!) idade, uma situação caótica dessas pode levar a perda total e definitiva dos sentidos, e na minha cabeça não cessava a pergunta:
- Quede o Rorge? Quede o Rorge?

Quase não conseguia mais concatenar minhas idéias e uma grande aflição estava prestes a me impedir de falar, e faltavam-me forças para me levantar do sofá e ir à cozinha tomar um gole d’água..., ou da branquinha, o mais aconselhável face ao deplorável estado em que me encontrava!, e, pelo menos, ia poder culpá-la dali pra frente!

Separava-me do mundo um abismo invencível e uma hora lentíssima se estava consumindo diante do meu olhar imóvel, vidrado, baço, que me exteriorizava o imo apavoramento.

Dentro da minha cabeça, um turbilhão desconexo e desvairado impedia-me de ter sequer um pensamento com começo, meio e fim, e as letras de Rorge começaram a se deslocar loucamente... o 'R' saía rumo ao Nordeste e se ia derreando com a seca... o 'O' vagava pela baía poluída e se intoxicava irremediavelmente, o outro 'R' seguia as pegadas do primeiro, o 'G' galhofava de mim despudoramente e o 'E' ecoava assustadora e crescentemente num vale assombroso... E E E E E!... E E E E E!...
Um suor frio e caudaloso percorria-me o corpo e afogava-me a razão, ia tragando insensivelmente os postremos fiapos de calma que ainda me prendiam à realidade...

Por sorte, meu neto surgiu e me viu naquela lastimável situação, e, por pouco, por muito pouco, não foi devorado pelo pânico!

Agarrou-me, levantou-me, sacudiu-me... e, felizmente, consegui balbuciar:
- R... o... r... g... e...

Aí, aliviado, ele me largou no sofá - a queda e o baque quase me transformaram em bocados soltos e vadios tal qual as letras do Rorge em minha mente -, e exclamou:
- Ah!... é isso... que bom!...

E prosseguiu didaticamente:
- Vô... tá tudo bem!... é escrito com jota - Jorge, mas a pronúncia é rota - Rorge; pra ficar mais fácil, pense em João - Roão, Juan - Ruan, Júlio - Rúlio, José - Rosé, janeiro - raneiro, junho - runho, julho - rulho!, e pronto!... tá resolvido!... Entendeu, vô?!

Ufa!... que alívio!
E enfiei os dois pés, as duas mãos e a cara na branquinha...