segunda-feira, maio 09, 2005

Ah... se eu não fosse malandro...

Peguei o táxi e sentei no banco traseiro, e por uma razão essencial, se você senta no banco da frente, o motorista acha que você quer ser íntimo e conversar, e começa a falar, e nem sempre o papo é agradável...

Disse pra onde ia e que caminho ia ser o melhor, pra evitar supresas taxímetras.

Quando ela fez um comentário... isso mesmo... era ela... vi, pelo retrovisor, que o rosto era uma gracinha... escpichei o pescoço por cima do encosto do banco dianteiro e vi que o peito era de respeito, e que ela estava de saia e com um bom pedaço de suas lindas coxas aparecendo...

Que mania de merda eu tenho, essa mania de sentar no banco de trás sem sequer olhar pro motorista... puta que pariu... nem mesmo uma olhadinha... porra!

E ela era nova, vinte e poucos... e puxei papo... no começo, foi praticamente um monólogo sobre o trânsito... sobre o preço das coisas... sobre a violência... sobre o tempo... sobre vida, família... aí, o monólogo começou a virar diálogo...

Ela hesitou, mas... falou... e começou a falar aumentando rapidamente a emoção... um casamento que não deu certo... uma filhinha pra criar, e sozinha numa cidade como esssa... e vi lágrimas surgirem e inundarem seus olhos...

E a emoção aflorara com tamanha intensidade que ela quase esqueceu de frear quando o ônibus que estava na nossa frente parou no ponto...

Minha mão já estava no ombro dela e o apertava paternal, quer dizer, amantemente, mas disfarçada de paternalmente... e ela acabou botando uma de suas mãos sobre a minha, e o fez com significativa pressão...

Se me perguntarem em que parte do trajeto estávamos, eu não sei dizer...

Como o choro não parava e até já produzira alguns soluços, senti que estava seriamente ameaçada a segurança dos transeuntes, e a nossa, o que, sem dúvida, foi uma convicente desculpa... e perguntei-lhe se não preferia parar, tomar alguma coisa pra se acalmar...

Ela não respondeu de pronto, mas, de repente, lembrou-se que conhecia um bar ali bem perto e fomos...

Só não esfreguei as palmas das mãos porque uma delas não desgrudava do ombro dela.

Quando paramos e ela saiu do táxi... meu amigo... que gata!... mulher quando sai do carro de saia, é aquela coisa... e, nesse caso, que coisa!, e que bunda!!!

O bar era bonzinho... ou seja, não era um pé-sujo...

Pedi uma cerveja, mas ela fez questão de pedir um refrigerante.

Quando o rapaz do bar trouxe as bebidas, embora estivesse perdido olhando pra gata, consegui reparar que a garrafa de cerveja já estava aberta... aí... veio o estalo!!!

Como não havia pensado nisso antes?!...

Como não havia pensado nisso antes?!
Logo eu... malandro da antiga, e ponha antiga nisso... cheio de calçada... cabeça coberta de sereno... como eu não havia pensado nisso antes?!...

Era tudo armação... aquela cerveja devia ter “boa-noite Cinderela” e o cacete a quatro... eu ia tomar a cerveja e um suadouro, e daqueles... iam me deixar nu... imagine só a machete do jornal... malandrão quase sessentão foi depenado e deixado nu, e aquela tarja, quer dizer, tarjinha negra cobrindo-me a genitália...

Que vexame...

Felizmente, malandro que é malandro não bobéia... e não bobeei... inventei uma vibração do celular e dei o fora... que a minha malandragem me havia tirado de uma grande arapuca...

Isso foi há uns dois meses...

Ontem, cheguei mais cedo ao boteco e estava já na segunda loura gelada e ninguém aparecia... aí... chegou o Adelinário... o cara é chato pra cacete... bobão... babacão... não tem sereno nem calçada... deve ter soltado pipa no ventilador e jogado bola de gude no tapete da sala... mas se não tem tu, vai tu mesmo... e o jeito foi encarar o papo com o Adelinário...

Reparei logo que ele estava diferente, não estava aporrinhativo... chateante... com aquele seu costumeiro papo que enche qualquer saco... e nem me deixou falar... começou imediatamente a contar que uma semana atrás pegara um táxi...

Não vou encher o seu saco qual faz com o meu o Adelinário... foi tudo praticamente igual, só que, por absoluta falta de malandragem, ele sentou no banco da frente....

Até o boteco foi o mesmo...

É claro que o babacão do Adelinário não viu que a cerveja já estava aberta, e bebeu a primeira, começou a segunda, e ele nem mesmo de beber como malandro é... e no primeiro copo da segunda já estava tonto e disse a Claudinha... é isso aí... esse é o nome dela... e, então, saíram do boteco... ela perguntou a ele se não se incomodava de ir buscar a filhinha dela na creche... e foram... depois... pra casa dela... e pensei... DANÇOU!... mas ainda não... foi jantarzinho etc. etc. etc., mas o Adelinário é tão babaca que até na hora de falar do etc. se envergonha e fecha o bico...
Segundo ele, que grande otário!, nessa semana, todo dia tem sido assim... casa da Claudinha e ele dando a ela o que ela tanto quer... carinho... atenção... aconchego... e as tais evasivas na hora do etc.

O Adelinário é mesmo um babacão... na certa, a Claudinha já sabe que ele é professor do município, que tem uma única matrícula, que mora num apartamentinho que lhe emprestou um tio e que dá a ex-mulher e aos filhos 70% do que ganha, e está de olho nos outros 30%... e o babacão ainda não viu isso... até confessou que a Claudinha o tem levado e apanhado na escola pra ele economizar o da passagem... mas que bobalhão...

Eu estava no meio desse pensamento quando a Claudinha parou o táxi na porta do bar e buzinou... e lá foi o otário do Adelinário... e a Claudinha estava com aquele sorriso lindo, sensual, carinhoso, feliz, aquele típico sorriso de quem, um dia, ainda vai dar um golpe naquele babacão...

Nem vou contar à turma essa história porque eles vão escalpelar o pobre do Adelinário...

Ah... se eu não fosse malandro...